sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

ROBERTO ROMANELLI MAIA


CHACINAS, MASSACRES
E A SOCIEDADE AMERICANA

ROBERTO ROMANELLI MAIA
ESCRITOR, JORNALISTA E POETA

Quando leio ou ouço comentários sobre a evolução do ser humano e da humanidade, não posso deixar de manifestar minha perplexidade e discordância quanto ao fato do Homem, como espécie, ter de fato evoluído ou pelo menos abandonado parte do que foi uma sucessão de violências cometidas entre irmãos.
Nessa longa lista de iniquidades, constam guerras, revoluções, massacres, genocídios, assassinatos, roubos, estupros, perseguições, sob os mas torpes pretextos e todas as possíveis e inimagináveis formas de degradação humana, na sua pior essência e natureza.
Sem entrar em considerações, que meus leitores poderiam analisar como de caráter filosófico, que não é caso, nem é a pretensão do presente artigo, o que todos nós pudemos constatar nesses últimos dias foi a ocorrência de mais um massacre ocorrido nos Estados Unidos, na cidade de Newton em Connecticut. Massacre cometido por um jovem, Adam Lanza, que aparentemente mesmo apresentando sintomas de uma inadaptação social, não possuía razões concretas, nem objetivas, para o cometimento de tal barbárie. 
Registre-se que desde Columbine, em 1999, aconteceram nos Estados Unidos outras 31 chacinas, sem que nenhuma medida séria, como seria o caso da proibição da venda de armas semi- automáticas, consideradas armas de uso na e para a guerra, fosse tomada pelos Presidentes americanos, nem pelo Congresso.
É do conhecimento público que ambos os poderes, o legislativo e o executivo, leia-se em especial os Presidente dos Estados Unidos, estão subjugados e não desejam contrariar a poderosa NRA, Associação Nacional do Rifle, formada por 4 milhões de pais, de filhos, que impedem, através de lobbys poderosos, quaisquer mudança que sejam restritivas à venda e ao acesso de armas na legislação americana.
Outra poderosa Associação, a Open Right Arms, também ativamente interessada na manutenção da legislação atual sobre armas, defende o direito de cada americano portar uma arma, de forma livre e sem restrição.  Sem a necessidade de que ela seja escondida dos outros e para tal justifica esse direito baseado na existência de uma emenda constitucional na Carta Magna dos Estados Unidos, que completou 222 anos, quando a realidade  sócio-política e econômica era totalmente diversa dos anos que se sucederam e do mundo atual.
Chega-se ao extremo de se permitir a entrada de armas nas escolas; o Estado de Michigan aprovou recentemente esse direito, revelando a força dos lobbys ligados a indústria bélica e aquela de armas nos Estados Unidos. 
Essa é a principal razão pela qual entre os 50 estados americanos, apenas Illinois e a cidade de Washington não permitem o uso e o porte de arma, de forma visível ou oculta, dentro de mochilas ou do porta luvas de carro. (por razões claramente de segurança das autoridades federais)
Esses fatos comprovam ser a sociedade americana uma sociedade permissiva, geradora de uma realidade social causadora de ações de violência individual e coletiva, previsíveis e esperadas, a qualquer hora.  
Em números, o quadro é dantesco, visto que dados recentes apontam a existência de 300 milhões de pistolas, de metralhadoras e de revólveres, de posse dos americanos. E 69% da população revela que já disparou uma arma em algum momento de sua vida.
Além disso, 47% dos americanos possuem pelo menos uma arma em casa; o movimento financeiro gerado por essa indústria alcança a cifra inimaginável de US$ 34,1 bilhões de dólares por ano somada a outras dezenas de bilhões de dólares, resultantes da pesquisa, fabricação de componentes, peças essenciais agregadas, intermediação nas vendas, e distribuição dos armamentos.
As vendas cresceram no último ano em 38,5% o que, em uma época de crise nos Estados Unidos e na maioria dos países, demonstra de forma inconteste, o crescimento da beligerância e da violência na sociedade americana. (último dado disponível)
Estas ações de extrema violência, que ocorrem frequentemente nos Estados Unidos aproximam-se em suas motivações e causas ao terrorismo islâmico sem que, no entanto, a sociedade americana tenha como identificar e responsabilizar um inimigo externo, como no caso dos atentados cometidos por radicais e extremistas islâmicos.
Esse ato sacrificial de alguns americanos, que executam tais barbáries, exprime toda um pensamento negativo de milhões de cidadãos americanos contra a sua sociedade, consumista e alienante, em seu máximo extremo.
Deixa claro que se trata de uma vingança de elementos inconformados, socialmente disfuncionais, lutando contra o que consideram o mal, porque na sociedade americana localizam a razão para a existência de suas disfunções e de seus problemas de compatibilidade e de adaptação.
Não se pode ignorar que os Estados Unidos, país que se considera exemplo e líder do mundo, apresenta dentro de suas fronteiras, um aumento da pobreza real,  de seus habitantes, que é patente devido ao desemprego e a insatisfação social e econômica, só comparável à época da recessão americana.
Nunca nos Estados Unidos revelou-se uma crescente e real fobia, uma perseguição e uma descriminação contra imigrantes legais e ilegais, oriundos da Ásia, da África, da América Latina, e em especial dos países árabes e islâmicos, tão clara e crescente, a ponto de lideres comunitários dessas etnias virem a púbico para a denunciar.
Sublinhe-se que essa mesma postura agressiva e perseguitória não acontece quando se trata da entrada de cidadãos de Israel que são, pelo contrário, bem recebidos e rapidamente incorporados à sociedade americana.
Diante de todos esses fatos não surpreende que tenha sido bem mais fácil apontar como causas motivadoras da chacina as tradicionais justificativas, razões e causas indicativas do fato de que Lanza era filho de pais divorciados e que sua mãe, igualmente uma mulher problemática e, também, disfuncional, tirou-o da escola, deixando-o estudar sozinho, sem nenhuma assistência familiar realmente digna desse nome.
Dentro desse quadro dramático, tão a gosto dos analistas, dos psicólogos e dos cientistas sociais, que não entendem a necessidade de se construir uma sociedade e uma família, onde todos ou a maioria dos pais possam se manter unidos ou casados, as crianças, os jovens e os adolescentes, em um momento critico de sua existência, identificam na própria sociedade americana a origem de seus problemas de adaptação e de convivência social.
Deparam-se, e necessitam conviver e interagir no dia a dia, com uma cultura consumista, voltada para a violência, para as armas e para a guerra, sem que de fato possam ver traduzidas as suas contestações e o sentimento de revolta contra tudo aquilo que os torna párias, dentro da aparente e falsa normalidade social, vigente na atual classe média americana.
A necessária e a consequente sociabilização dos filhos deixou de acontecer, através de uma real educação familiar e de uma escola, onde práticas do bullying sejam de fato proibidas e excluídas do dia a dia escolar, na prática, em milhões de lares e de famílias nos Estados Unidos.
Hoje, eles estão á solta, nas ruas, e em todos os lugares, nas escolas, templos, cinemas, bares, etc. São jovens revoltados porque perderam seu espaço, seu emprego; possuem problemas de relacionamento com outros jovens na escola, na família ou no trabalho. Apresentam desequilíbrio mental, quadros clínicos patológicos, sintomas de bipolaridade e, sem nenhuma dúvida,  uma propensão adquirida em poucos anos de vida para atos e ações violentas.
Mas acima de tudo o que já acontece em materia de violência, há anos nos Estados Unidos, é a certeza de que chacinas, massacres e crimes de tal monta, continuarão a ocorrer nesse país se, em pouco tempo, as verdadeiras e reais causas não forem corrigidas e encaradas de forma séria, responsável.
Massacres também continuarão a acontecer, semelhantes a estes que ocorrem habitualmente nos Estados Unidos, numa frequência além de qualquer explicação simplista, que em geral são manifestas e expressas por cientistas e estudiosos, que se consideram “experts e entendidos” nessa questão.
Fato é que não podemos esquecer que sempre que sucede uma chacina idêntica nos Estados Unidos, os americanos da chamada "maioria silenciosa e da classe média", sempre buscam o óbvio, para toda a violência justificar, mas nunca as razões fulcrais, como afirmou Michel Moore. Para ele a causa primeira desses massacres é a própria cultura americana, já que até a arma usada por Lanza levou o nome (Bushmaster) como homenagem ao Ex-Presidente americano Bush.
Diante desse tipo de homenagem, o que pensar? 
Qual seu significado, senão o de avalizar toda uma política interna e externa, voltada para a violência, para a guerra e para o domínio de povos, por uma superpotência que decai ano após ano e se esvai no sangue dos seus cidadãos.
Ainda assim, os Estados Unidos continuam a enviar a mesma mensagem e o mesmo recado para o mundo: nós somos os guardiões da Terra e cabe a nós decidir por toda a humanidade quais os caminhos que ela deve trilhar!
Sabemos que muitos que se deixam manipular e influenciar pela propaganda estadunidense defendem tal postura e acreditam que de fato os Estados Unidos são a “ terra prometida”, onde todos serão felizes, bem sucedidos, realizados. E que esse país é o lugar ideal para que seus filhos e netos cresçam, alcancem o sucesso e vivam em paz!
Doce engano e triste mentira!
TELA: bosch

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